Título: O Livreiro de Cabul
Título Original: Bokhandleren i Kabul
Autor: Asne Seierstad
Editora: Record
Número de Páginas: 316
Título Original: Bokhandleren i Kabul
Autor: Asne Seierstad
Editora: Record
Número de Páginas: 316
O
livreiro de Cabul é um livro-reportagem narrado por uma hábil escritora.
Não se trata meramente de mais “um olhar humanizado sobre a matéria”, máxima
que muitos jornalistas escutam nas redações na hora de contar aos seus leitores
os dramas humanos. A obra de Asne Seierstad vai além do jornalismo literário
convencional. É pura literatura, romântica e não piegas, com pinceladas de bom
jornalismo.
O
livro remete às crônicas de viagem do século XIX, pois traz seu quinhão de
pitoresco e exótico na narrativa do cotidiano de uma família afegã, mas sem
cair na esteriotipação que nasce dos preconceitos. Asne é uma estrangeira em
meio a uma cultura mal-compreendida e estranha ao ocidente, por isso o encanto
e a surpresa do olhar forasteiro estão lá, mas ela se permite viver a rotina de
seus anfitriões e olhá-los com o máximo de isenção, sem contudo perder o calor
da tão buscada “humanização da notícia”.
Tanto
cuidado não impediu no entanto, que a família que serviu de modelo para a obra
de Asne, processasse a escritora e pedisse compensações financeiras por
“transtornos causados devido às revelações feitas na obra”. O resultado do
julgamento foi a doação de uma parte dos direitos autorais para uma fundação
que visa promover a literatura afegã, sugestão da própria autora.
No
livro, o personagem principal, Sultan Khan, é inspirado em um livreiro de carne
e osso, que enfrentou poucas e boas para garantir o funcionamento de suas
livrarias durante o Talibã. Embora tivesse um comportamento liberal e
progressista na área da cultura, Sultan Khan dirigia a família com mão de
ferro, seguindo os preceitos do fundamentalismo islâmico no trato com as
esposas e filhos.
Sem
fazer concessões, mas tampouco tecer juízos de valor, a autora não esconde a
admiração que aprendeu a sentir pelo patriarca do clã que a hospeda na
tumultuada Cabul de muitas guerras civis e invasões. Mesmo admitindo que
algumas ações de seu anfitrião são condenáveis sob o ponto de vista da
sociedade na qual foi educada, Asne não deixa de mostrar um outro ponto de
observação pelo qual o leitor pode tecer suas próprias considerações.
A
escritora parece compreender com bastante clareza o fato dos seres humanos
serem luz e sombra ao mesmo tempo. Mais que isso, boa parte das ações humanas
se origina na zona cinzenta que faz o ponto de intersecção entre a luz e a
sombra. Pena que a família do livreiro não gostou do resultado, ou se
arrependeu de deixar alguém devassar sua intimidade.
Sem
esconder a opressão vivida pelas mulheres afegãs, tema largamente explorado na
literatura e amplamente mostrado na mídia, ela investe em esmiuçar outro ângulo
da mesma questão, revelando que as relações de gênero no Afeganistão são bem
mais complexas do que sonha a vã filosofia maniqueísta da cultura ocidental. Os
homens de lá também vivem oprimidos, tanto por regimes que cerceiam as
liberdades civis, quanto pelo peso da tradição.
Fonte:
Mar de Histórias (http://abre.ai/FCK)
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