segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Especial Novelas: Gabriela (1975)


Sônia Braga e Armando Bógus
Adaptação livre de Walter George Durst do romance Gabriela, Cravo e Canela (1958), de Jorge Amado, a história se passa em 1925, quando uma seca devastadora obriga as populações famintas do Nordeste a emigrar em busca da sobrevivência. Na novela, o destino é Ilhéus, no sul da Bahia, região em expansão graças ao plantio e comércio do cacau. Gabriela (Sônia Braga) é uma das vítimas da seca. Moça de natureza livre e impulsiva, ela consegue trabalho como cozinheira na casa do "turco" Nacib (Armando Bógus), com quem vive uma sensual história de amor. Jovem bonita e cheia de vida, dona de uma sensualidade espontânea, Gabriela logo passa a ser o principal objeto de desejo dos homens da cidade, além de alvo da inveja das mulheres. Simples e ingênua, ela encontra dificuldades para assimilar as regras de comportamento da sociedade de Ilhéus. Nacib, por sua vez, nasceu na Síria e foi criado no Brasil. 

Eloísa Mafalda (Maria Machadão)
Homem de alma leve, que tem riso e conversa fáceis, é o dono do Bar Vesúvio, por onde transitam várias figuras pitorescas do local, como o professor Josué (Marco Nanini), Alfredo Bastos (Hemilcio Fróes), Berto Leal (Mário Gomes), Juca Viana (Pedro Paulo Rangel), Ezequiel Prado (Jayme Barcellos), Doutor (Ary Fontoura), João Fulgêncio (Luís Orione), Tonico Bastos (Fúlvio Stefanini) e Tuísca (Cosme dos Santos). Por conta do jeito simpático e bonachão, o "turco" sabe tudo o que se passa na cidade, embora seja conhecido por ser discreto, confiável e não emitir opiniões comprometedoras. Ama as mulheres e, até conhecer Gabriela, frequenta, como quase todos os homens de Ilhéus, o Bataclan, cabaré animado pelas “raparigas” de Maria Machadão (Eloísa Mafalda), entre as quais está a sua favorita: a bela e atrevida Zarolha (Dina Sfat).
 
Dina Sfat (Zarolha)
A chegada de Gabriela muda a vida de Nacib. Antes dela, ele contava apenas com a ajuda de Chico Moleza (Tonico Pereira), seu assistente no bar, e Arminda (Thelma Reston), que realizava algumas tarefas domésticas. Depois que Gabriela se torna sua cozinheira, ele se apaixona pela moça e começa a ter um caso com ela. Mas a natureza sem pudores da moça o deixa enciumado e furioso. Ela se diverte com as crianças que brincam na rua como se fosse uma delas, e não tem consciência do efeito que causa nos homens, a quem trata, sem distinção, pelo pronome “seu”. Quando fica admirada com um rapaz bonito, diz naturalmente: “Que beleza de moço!”.

Paulo Gracindo e Castro Gonzaga
A solução encontrada por Nacib é casar-se com Gabriela. Ele tem esperanças de que, deixando de ser sua empregada, ela passe a se comportar de forma mais comportada. A moça, porém, não consegue mudar seu jeito de ser. Mesmo após o casamento, continua a tratar o marido por “Seu Nacib” e a se comportar da mesma forma livre de antes. Perto do fim da trama, Gabriela acaba caindo na lábia de Tonico Bastos, padrinho de casamento de Nacib. O turco flagra os dois na cama e expulsa a mulher de casa. Gabriela encontra abrigo no Bataclan. No final da novela, Nacib a perdoa. Gabriela aborda a transformação nos costumes da sociedade patriarcal da Bahia, cujo maior representante, na trama, é o coronel Ramiro Bastos (Paulo Gracindo), fazendeiro que domina a região há anos, reelegendo políticos à custa de eleições fraudadas. Aos 82 anos, ele é um homem seco e autoritário, que sente que os tempos estão mudando e seu controle sobre a cidade precisa ser reafirmado.

Nívea Maria
Quem faz o contraponto à autoridade do coronel é o jovem exportador de cacau Mundinho Falcão (José Wilker), pertencente a uma família rica de São Paulo. Idealista e genuinamente interessado no progresso da cidade, ele se alia à oposição com vistas à renovação política da região. Uma de suas primeiras propostas é a construção de um porto para a cidade, o que o leva a entrar em conflito direto com Ramiro Bastos. A rivalidade é acirrada quando Mundinho se apaixona por Jerusa (Nívea Maria), neta do coronel. A morte do coronel Ramiro Bastos no final da trama deixa uma esperança de mudança política em Ilhéus. Mundinho Falcão torna-se o nome mais forte do panorama político local, e é a imagem da renovação. Entretanto, na última cena da novela, ele aparece todo vestido de branco, sendo saudado pelas baianas que beijam sua mão em praça pública, um gesto típico de reverência aos coronéis da região.

Tramas Paralelas:

José Wilker e Elizabeth Savalla
Malvina e a mulher brasileira
Outro conflito que marcou Gabriela foi a luta das mulheres para se libertarem do jugo patriarcal, representada por meio da recusa da personagem Malvina (Elizabeth Savalla) a aceitar um casamento arranjado pelos pais. Em nome do amor que sente pelo professor Josué (Marco Nanini), um poeta romântico, mais velho e sem dinheiro, Malvina enfrenta o pai, o coronel Melk Tavares (Gilberto Martinho), e assume atitudes ousadas para as mulheres da época. A personagem vive ainda um romance com um homem desquitado, o galante Rômulo Vieira (Marcos Paulo), e chega a abandonar tudo para fugir com ele, que, apesar do prometido, não vai ao seu encontro.

Fúlvio Stefanini e Natália do Valle
Produção:
Produzida para comemorar os dez anos da Rede Globo, Gabriela recebeu tratamento digno de uma superprodução. Os 20 primeiros capítulos de Gabriela foram gravados com uma câmera fixa. Isso só mudou com a entrada na trama de Mundinho Falcão (José Wilker), personagem que simbolizava a modernidade e a mudança, em contraponto aos padrões arcaicos do coronelismo. Já na primeira cena com Mundinho, as câmeras ganham mobilidade e acompanham a trajetória do barco que traz o personagem a Ilhéus.

Censura:
Em um dos capítulos de Gabriela, o estudante Juca Viana (Pedro Paulo Rangel) e a jovem Chiquinha (Cidinha Milan), amante do coronel Coriolano (Rafael de Carvalho), são flagrados na cama. Debaixo de chuva, os dois são atirados à rua completamente nus, escorraçados pelos jagunços do coronel e humilhados pela população. A cena foi considerada muito forte para os padrões da Censura Federal. O diretor Walter Avancini optou por gravar as tomadas à distância, seguindo a orientação do script de Walter George Durst, que descrevia o casal como estando “de fato, aparentemente nu, mas não podendo se ver nada por causa do plano”.  

Curiosidades:

Armando Bógus e Marco Nanini
A primeira mulher a viver Gabriela na TV foi a atriz Jeanette Vollu, em  Gabriela Cravo e Canela, seriado dirigido por Maurício Sherman e exibido na TV Tupi, em 1961. Em entrevista a O Globo, em 1975, Sherman conta que a atriz foi escolhida por uma comissão da qual faziam parte o próprio Jorge Amado e sua mulher, Zélia Gattai.  O seriado teve 40 capítulos, de 20 minutos,  exibidos sem intervalo comercial, às terças e quintas-feiras.  O elenco contava ainda com o próprio Maurício Sherman,  Paulo Autran, Glauce Rocha, Grande Otelo, Sueli Franco, Oswaldo Loureiro, Jece Valadão, Milton Moraes e  Oduvaldo Vianna Filho, entre outros.

Segundo Daniel Filho, Gabriela foi idealizada para dar tempo de produzir a novela O Rebu, de Braúlio Pedroso. Mas esta foi exibida antes, e Gabriela foi levada ao ar para comemorar os dez anos da TV Globo. A trama, segundo o diretor, foi pensada levando-se em conta uma estrutura narrativa calcada em diferentes episódios.

Daniel Filho conta que, durante a procura pela mulher ideal para viver Gabriela, tentou uma escolha inusitada: fez um convite a Gal Costa. A cantora baiana, entretanto, declinou, alegando não saber representar. Em seguida, inúmeros testes foram feitos para a personagem; mas o diretor decidiu que o papel teria de ser de Sônia Braga desde que viu seu desempenho em Caminhos do Coração – Caso Especial escrito e dirigido por Domingos Oliveira em 1971 –, e insistiu com Boni para que ela fosse escolhida. A atriz acabou consagrada no papel, que voltaria a representar em 1983, no filme Gabriela, de Bruno Barreto, atuando ao lado do italiano Marcello Mastroianni, intérprete de Nacib.

Elizabeth Savalla
Elizabeth Savalla ganhou o papel de Malvina depois de um teste ao lado de Marcelo Picchi, seu marido na época. Diante de Walter Avancini e Ziembinski, os dois representaram uma cena da novela Escalada(1975). Avancini os fez repetir várias vezes a cena, implicando com a pronúncia da atriz em uma fala na qual tinha que dizer “Veuve Cliquot”, nome do champanhe francês. Na quarta repetição, depois de ter se esforçado ao máximo para pronunciar corretamente a palavra, a atriz perdeu a paciência e confrontou o diretor, dizendo estar mais preocupada em representar direito do que em ter uma aula de francês. Depois do teste, foi informada de que ganhara o papel. A personagem era rebelde e contra as convenções, e o diretor a provocara de propósito.

Os atores tiveram dificuldades para gravar a cena do velório de dona Sinhazinha, personagem de Maria Fernanda. Participavam da gravação os atores Armando Bógus, Ary Fontoura e Elizabeth Savala. A atriz conta que estava dizendo suas falas quando foi interrompida por um ruído estranho. É que Maria Fernanda dormira e estava roncando. Os três começaram a rir, mas foram repreendidos pelo diretor Walter Avancini. Não adiantou. Todas as tentativas de reiniciar a cena terminavam em risos. O jeito foi parar para o almoço, acordar Maria Fernanda e continuar a cena depois.

Para ajudar a trabalhar o sotaque baiano de Malvina, Elizabeth Savala contou com a ajuda de Lúcia Andrade Rocha, mãe do cineasta Glauber Rocha.

Sônia Braga
Marco Nanini, natural de Recife, sugeriu ao diretor Walter Avancini que seu personagem fosse um pernambucano que foi morar na Bahia. A sugestão foi aceita e a questão da prosódia e da melodia da fala foi resolvida.

Nívea Maria não foi a primeira opção da direção para interpretar a personagem Jerusa, neta do coronel Ramiro Bastos (Paulo Gracindo). A atriz conta que, ao ser chamada para fazer o papel, o diretor Walter Avancini pediu que ela pintasse os cabelos de louro. Ela rejeitou a ordem mas, ainda assim, ganhou a personagem, par romântico do idealista Mundinho Falcão (José Wilker).

Gabriela foi um dos maiores sucessos da Rede Globo. Além dos altos índices de audiência, a novela foi escolhida pela Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA) como a melhor produção de 1975. Por conta da ótima repercussão da trama, os atores participaram de eventos em Ilhéus, sendo recepcionados por multidões de fãs.

A novela consagrou Sônia Braga como símbolo sexual.

As atrizes Elizabeth Savala e Natália do Vale estrearam em Gabriela.

Hugo Carvana fez uma participação especial na trama, interpretando um poeta louco.

Stênio Garcia participou de dois capítulos da novela, vivendo Felismino, um personagem que era traído pela mulher.

José Wilker como Mundinho Façcão
José Wilker credita parte do sucesso de Gabriela ao acerto na escalação do elenco, além da solidez dos personagens. O ator conta que a cumplicidade entre atores e personagens era tanta que ele até reescrevia algumas cenas suas, com a anuência do diretor Walter Avancini.

Gabriela foi a primeira telenovela a ser vendida para Portugal e abriu as portas de outros continentes para a compra de novelas brasileiras. Em maio de 1977, quando a novela estreou no país, a Rádio e Televisão Portuguesa (RTP) promoveu um show com Vinicius de Moraes, Toquinho e Maria Creuza. Elizabeth Savala conta que ela e Fúlvio Stefanini viajaram a Portugal para promover a produção, e foram recebidos por uma multidão no aeroporto. Todas as meninas tinham o corte de cabelo de Malvina, enquanto os rapazes portavam pentes iguais ao usado pelo personagem Tonico Bastos. Assim como Savala, Fúlvio Stefanini marcou época com seu papel.

A bengala usada pelo personagem Rômulo Vieira, interpretado por Marcos Paulo, não era um mero acessório da caracterização. Ela foi incorporada ao personagem por conta de uma necessidade do ator, que sofrera um grave acidente de moto em janeiro de 1975.

Gabriela foi reprisada – em forma de um compacto com 70 capítulos – entre janeiro e maio de 1979, e entre outubro de 1988 e fevereiro de 1989.

Em junho de 1982, a novela foi reapresentada em 12 capítulos, exibidos às 22h15. Para isso, foi feita uma reedição dos 135 capítulos originais, sob a direção de Ubiratan Martins. 

Elenco:
Sônia Braga – Gabriela

Armando Bógus – Nacib
Paulo Gracindo – Ramiro Bastos
José Wilker – Mundindo Falcão
Nívea Maria – Gerusa Bastos
Eloisa Mafalda – Maria Machadão
Elizabeth Savalla – Malvina
Fúlvio Stefanini – Tonico Bastos
Ângela Leal – Olga
Dina Sfat - Zarolha
Gilberto Martinho – Melk Tavares
Marco Nanini – Professor Josué
Ary Fontoura – Doutor Pelópidas
Francisco Dantas – Coronel Jesuíno Mendonça
Maria Fernanda – Dona Sinhazinha
Neila Tavares – Anabela
Jayme Barcellos – Doutor Ezequiel
Hermílcio Fróes – Alfredo
Luis Orioni – João Fulgêncio
Ana Ariel – Idalina Tavares
Paulo Gonçalves – Maurício Caíres
Rafael de Carvalho – Coriolano
Mário Gomes – Berto Leal
Castro Gonzaga – Doutor Amâncio Leal
Thelma Reston – Arminda
Natália do Valle - Teodora
Pedro Paulo Rangel - Juca Viana
Cosme dos Santos – Tuísca
Tonico Pereira – Chico Moleza
Milton Gonçalves – Sete Voltas
Marcos Paulo – Rômulo Vieira
Sônia Oiticica – Sílvia Bastos
Ana Maria Magalhães – Glória
João Paulo Adour – Osmundo Pimentel

Trilha Sonora:
Capa: Sônia Braga

Coração Ateu - Maria Bethânia

Guitarra Baiana - Moraes Moreira
Alegre Menina – Djavan
Quero Ver Subir, Quero Ver Descer - Wálter Queiróz
Horas - Quarteto Em Cy
São Jorge dos Ilhéus - Alceu Valença
Modinha Para Gabriela - Gal Costa
Filho da Bahia - Fafá de Belém
Caravana – Geraldo Azevedo
Porto - MPB4
Retirada – Elomar
Doces Olheiras - João Bosco
Adeus - Walker

Abertura

cena de Elizabeth Savalla


Elenco


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